terça-feira, 25 de agosto de 2009

"Eu não jogo para perder"

Depois de um período de estagnação, a Claro volta a crescer de forma agressiva no Brasil -- e a meta de seu presidente, João Cox, é chegar à liderança já no ano que vem

Em março de 2006, enquanto se preparava para uma tão aguardada viagem de férias à Itália, o executivo João Cox, de 46 anos, recebeu um telefonema inesperado. Do outro lado da linha, Daniel Hajj, genro do magnata mexicano Carlos Slim Helú e presidente da América Móvil, dona da Claro, convidava-o a fazer um "pequeno desvio" em seu itinerário. Os dois haviam se conhecido poucos meses antes, quando Cox, então dono de uma butique de investimentos, havia batido à porta da operadora para oferecer serviços de assessoria financeira -- préstimos que acabaram gentilmente recusados. A conversa, realizada na austera sede da operadora, na Cidade do México, durou apenas 40 minutos. Mas foi suficiente para que Cox aceitasse o convite para presidir a Claro, colosso com faturamento de 11 bilhões de reais e mais de 40 milhões de clientes. Naquela época, a subsidiária brasileira era a única do grupo que ainda sangrava dinheiro. Tamanha era a insatisfação dos mexicanos com a operação local que o próprio Slim, pouco afeito aos pormenores do negócio, solicitou a troca de comando e fez questão de conhecer Cox pessoalmente antes que ele tomasse posse oficialmente do cargo, em agosto de 2006.
Desde então, a relação entre o executivo brasileiro e os mexicanos evoluiu bem -- a ponto de Slim ter elogiado o trabalho de Cox nas duas vezes em que esteve no Brasil de 2007 para cá. Mas o clima amistoso ganhou ares de tensão no segundo trimestre deste ano, quando a Claro diminuiu o ritmo de expansão no Brasil. A redução de aproximadamente 50% na verba destinada ao subsídio de aparelhos, um dos principais motores de crescimento da Claro, aliada a um recrudescimento da concorrência, fez com que a participação de mercado da operadora caísse de 25,76% para 25,36% entre os meses de abril e junho deste ano. Queda mínima, mas suficiente para fazer soar o sinal de alerta no México. Em sua última visita ao Brasil, realizada em junho, Hajj, o poderoso genro de Slim, foi taxativo: a Claro deveria voltar a crescer de maneira agressiva, de modo a tirar a diferença de 6 milhões de clientes que a operadora mantém em relação à Vivo, atual líder do setor. Diante disso, Cox apressou-se em lançar novos planos de serviços, firmou parcerias com fabricantes de aparelhos para distribuir seus chips no varejo e intensificou os investimentos em publicidade. Em julho, a Claro conquistou quase 600 000 clientes -- de longe seu melhor desempenho no ano. "Eu não jogo para perder", diz Cox. "Minha meta é chegar à liderança do mercado."

A atitude de Cox, bem como sua meta, pode ser explicada pelo desempenho recente da Claro. Sob seu comando, a operadora protagonizou uma das viradas mais impressionantes do setor de telefonia no país. A geração de caixa da empresa, que foi de 400 milhões de reais negativos em 2005, encerrou 2008 em 2,7 bilhões de reais, a segunda maior do grupo América Móvil, só perdendo para a matriz. A operadora também foi a que mais cresceu no ano passado: conquistou 8,5 milhões de clientes, ultrapassando a TIM na vice-liderança do ranking. E, não fosse pela compra da Telemig, a Claro teria, também, alcançado a Vivo em 2008. "O crescimento da Claro vem ocorrendo de maneira consistente", afirma Jean-Claude Ramirez, especialista em telecomunicações da consultoria Bain&Company. "É isso que assusta as rivais." Hoje, a operação brasileira é a que conta com a maior taxa média de crescimento no grupo: 25%. O que tem surpreendido analistas e especialistas de mercado não é o ritmo de expansão em si, mas a qualidade dos clientes que a operadora tem conquistado. A Claro, que já foi considerada o patinho feio das operadoras, conta atualmente com a maior base de clientes do segmento pós-pago no Brasil: 20,8%.

Como acontece nos conglomerados familiares do México, predomina na América Móvil uma cultura em que o tempo de casa e a lealdade dos funcionários pesam mais do que os resultados obtidos na operação. Cox foi o primeiro executivo do grupo a desafiar essa regra. Um dos raros não mexicanos a presidir uma das 18 subsidiárias da empresa, ele substituiu 12 dos 13 diretores logo que chegou à Claro. Além disso, dobrou o percentual variável da remuneração dos novos diretores, atrelando-o a resultados. No início, enfrentou muita resistência. O processo foi exaustivamente negociado com o México. Algumas substituições, como no caso das áreas financeira e de marketing, chegaram a ser discutidas ao longo de seis meses. "Daniel Hajj é avesso a mudanças repentinas", afirma um executivo que acompanhou de perto o processo. "Mas Cox foi taxativo. Se Hajj quisesse resultados, teria de ceder na troca da equipe. Os mexicanos que dirigiam operações em outros países ficaram boquiabertos." À medida que os resultados foram aparecendo, Cox ganhou mais status com a matriz. Atualmente, ele é o único executivo do grupo que acompanha Daniel Hajj e Carlos Cárdenas, chefe de operações da América Móvil, em negociações mundiais com fornecedores.

A desenvoltura com que João Cox tem comandado a Claro é uma surpresa para o mercado -- e, de certa forma, até para ele mesmo. Formado em economia pela Universidade Federal da Bahia, Cox trabalhou por 13 anos na Odebrecht, e sempre foi do tipo que preferia a companhia da calculadora aos espalhafatosos eventos de marketing e vendas, tão comuns em empresas de serviços. A mudança no comportamento, e na carreira, ocorreu em 2002, quando ele assumiu a presidência da holding que controlava a Telemig e a Amazônia Celular (até então, ele era diretor financeiro da empresa). Além de administrar uma feroz disputa societária entre o banco Opportunity e os fundos de pensão, coube a Cox a tarefa de impedir que a Telemig fosse engolida pelo avanço da TIM e da Oi em Minas Gerais. "Cox não era um homem de vendas", afirma um executivo que trabalhou na Telemig nessa época. "Ele aprendeu na marra como administrar uma empresa de serviços." O pulo-do-gato veio com o lançamento de um programa de milhagens, semelhante ao empregado pelas companhias aéreas. Quanto mais minutos o usuário falava ao celular, mais descontos ganhava na compra de novos aparelhos. Com isso, Cox conseguiu aumentar o lucro da Telemig em 135% em dois anos e a base de clientes em 42%. O projeto acabou replicado por todas as operadoras do país.

Para que a Claro continue crescendo de maneira agressiva no Brasil e, com isso, conquiste a liderança de mercado, Cox precisará de mais do que o simples apoio -- ou o dinheiro -- vindo do México. O sucesso das campanhas de desbloqueio de aparelhos perpetradas pela Oi tem colocado em xeque o principal modelo de negócios da operadora mexicana, ancorado no subsídio de celulares. "A Claro gasta uma fortuna para oferecer aparelhos mais baratos", afirma um consultor especializado em telecomunicações. "O problema é que, com custos menores, outras operadoras acabam oferecendo planos de serviços mais vantajosos. É como se a Claro subsidiasse a concorrência." Não por acaso, a Oi tem levado vantagem sobre a Claro na disputa pelos principais mercados do país, como as regiões Sul, Centro-Oeste e o estado de São Paulo. Além disso, a italiana TIM, que patinou durante boa parte de 2008, já começa a esboçar sinais de recuperação após uma troca de comando realizada no início deste ano. Se não agir rápido, o ambicioso João Cox pode ser convidado a fazer outra viagem de emergência ao México -- e Slim pode não ter nas mãos um convite, mas cobranças.

Por: Carolina Meyer - Portal Exame

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