sexta-feira, 26 de junho de 2009

O falso dilema familiar

Com nosso pai prestes a se aposentar, meu irmão e eu devemos assumir os negócios da família. O desempenho da empresa é muito bom, mas será que vocês poderiam nos dizer como mudar algumas divisões que ganhariam muito se adotassem práticas de gestão modernas? Só não queremos interferir em nossa cultura tão especial... (Anônimo, Kerala, Índia)

De certa forma, a pergunta que você nos faz é universal. Praticamente todos os novos líderes, quer estejam assumindo uma pequena empresa familiar ou uma companhia de capital aberto em expansão, têm de imaginar um meio de modificar as áreas improdutivas sem prejuízo daquelas que parecem estar funcionando bem. Portanto, a resposta à sua pergunta também é de abrangência universal. O líder estimula a mudança quando explica claramente por que ela é necessária, quando pinta um quadro do futuro da empresa, quando descreve aos funcionários as vantagens do plano a ser posto em prática. Tudo isso ressaltando a necessidade imperiosa de que a mudança aconteça de maneira constante e sem tréguas, até que seja totalmente aceita e implantada.

Existe uma razão para que as pessoas vejam dificuldades na mudança. Em empresas familiares como a sua, mudar pode ser uma experiência muito difícil exatamente por causa daquilo que você descreveu como "cultura especial". As empresas familiares diferem das grandes empresas em geral devido à sua cultura - na verdade, é por isso que muita gente se sente atraída por elas. Independentemente do tamanho, essas empresas familiares tendem a ter uma atmosfera mais intimista. Você trabalha para uma pessoa de verdade ou para o legado deixado por ela, e não para uma entidade genérica cujos donos são um conjunto de acionistas sem rosto. Além disso, as empresas familiares costumam ter um ambiente mais conciliador, em que o mau desempenho é quase sempre interpretado num contexto em que se levam em conta os problemas pessoais do funcionário. Não faltam chances para quem não tem a performance desejada. A cultura dessas empresas traz sempre embutido um sentimento de orgulho, segurança e continuidade, o que torna a introdução de mudanças um assunto muito delicado para a liderança.

Isso, no entanto, é só parte da dificuldade. A outra parte tem a ver com seu pai. A maior parte das empresas familiares gira em torno da figura do patriarca. Seus valores dão o tom ao negócio, sua palavra tem o mesmo peso que o evangelho. As pessoas acreditam que ele carrega a empresa no sangue. Afinal de contas, foi graças à sua sabedoria que ela foi construída. Portanto, qualquer novo líder que venha a substituir o patriarca, seja ele um membro da família preparado durante muito tempo para isso, seja alguém vindo de fora, precisa entender uma coisa: a ajuda desse patriarca é fundamental.

É bem possível que seu pai tenha lhe dito que apoia seus planos de mudança. De fato, nas empresas familiares mais bem-sucedidas, os patriarcas contam realmente com seus descendentes para a introdução de práticas modernas que eles mesmos não foram capazes de vislumbrar. Em nossa experiência, porém, o líder prestes a deixar a empresa nutre certa ambivalência em relação ao novo rumo proposto para a instituição depois de sua saída. E, como sempre acontece nas famílias, todo mundo sabe disso. O que você pode fazer?

Nas empresas abertas, normalmente aconselhamos que as mudanças sejam feitas de forma rápida. No seu caso, porém, vamos abrir uma exceção. Para conseguir o apoio do patriarca, os novos líderes de empresas familiares precisam dar um tempo, de modo que as coisas possam ir acontecendo aos poucos. Durante esse período, certifique-se de que seu pai compreenda que você respeita sinceramente tudo o que ele construiu. Certifique-se também de que ele entenda as vantagens financeiras, competitivas e até mesmo culturais de seu programa de mudanças. Por fim, e esta talvez seja a parte mais importante, tente descobrir um meio de fazer com que ele participe do processo de mudança, em vez de simplesmente acompanhá-lo em silêncio. Esteja certo de que nada convencerá mais os empregados da importância das mudanças do que o testemunho favorável de seu ex-líder.

Não queremos que você pense que estamos lhe passando uma fórmula. A sucessão nas empresas familiares nem sempre é tão organizada e previsível - assim como as próprias famílias! Contudo, se você administrar essa fase com as emoções no lugar certo, terá a oportunidade de construir algo notável: uma empresa familiar que cresce mais e melhor nas mãos da nova geração.

Por: Jack Welch (Portal Exame)

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