terça-feira, 2 de junho de 2009

Desaparecimento de avião da Air France deve reduzir venda de passagens


Especialistas consideram que haverá um impacto negativo no curto prazo na procura por bilhetes, mas sem grande impacto para Gol, TAM e Embraer

Apesar de não envolver uma empresa aérea brasileira nem de aparentemente ter havido falha da infraestrutura e do sistema de segurança de voos do país, o desaparecimento do Airbus da Air France que decolou do Rio de Janeiro com destino a Paris no domingo pode ter, no curto prazo, um impacto na venda de passagens aéreas.

"O impacto principal vai ser sobre a demanda de passageiros. Se o mercado esperava uma recuperação das vendas, isso deve demorar mais tempo", diz Victor Mizusaki, analista da corretora do Itaú, que trabalha de forma independente do banco. "Mas é cedo ainda para avaliar o impacto", afirma.

Para o consultor e especialista em transporte aéreo, Mauro Ricardo Nascimento Martins, no entanto, o efeito imediato deve ser de uma queda de 5% a 10% no tráfego de passageiros para destinos internacionais. Esse índice pode ser um pouco maior nos voos a partir do aeroporto Tom Jobim, de onde decolou o avião da Air France.

A explicação de especialistas é de que a intensa cobertura da mídia sobre qualquer acidente aéreo assusta os passageiros. Reforça a percepção de insegurança o fato de essa ter sido a terceira queda de uma grande aeronave comercial no país em pouco mais de três anos. Em 2006, a colisão de raspão entre um Legacy da Embraer e um Boeing da Gol matou os 154 ocupantes. No ano seguinte, um Airbus da TAM não conseguiu frear no aeroporto de Congonhas, saiu da pista e se chocou contra um prédio da própria empresa aérea, matando 199 pessoas.

Haverá descontos?
Outro fator que pode prejudicar principalmente a TAM é a provável concessão de descontos pela Air France para voltar a atrair passageiros para os voos entre a França e o Brasil.

Uma resolução aprovada pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) já liberou a concessão de descontos de até 20% nas passagens internacionais. Em julho, esse percentual poderá subir a 50%. A partir de abril de 2010, deixará de existir um preço mínimo e as tarifas poderão ser até mesmo zeradas se essa for a estratégia da companhia aérea.

"O episódio pode acirrar ainda mais a guerra das tarifas mais baixas para as viagens internacionais, uma vez que a Air France pode querer compensar a queda na procura por voos por meio de passagens com valores finais mais atrativos ", diz o consultor Martins.

Impacto limitado
Mesmo assim, especialistas em setor aéreo acreditam que o impacto direto nas operações da Gol, da TAM e da Embraer deve ser bastante limitado. Outros fatores como a liberação do preço das passagens aéreas para o exterior, o comportamento dos preços do petróleo e a taxa de câmbio devem ser muito mais determinantes para os resultados das empresas.

Martins prevê que o mercado de voos internacionais deverá crescer de 3% a 5% neste ano, enquanto os voos domésticos terão expansão de 5% a 10%. No primeiro semestre, o mercado doméstico tem sido bastante incentivado pelo maior número de feriados em relação ao ano passado. Já a demanda externa deve ter uma expansão menor devido à crise internacional e à gripe suína.

Para a analista Kelly Trentin, da corretora SLW, a alta dos preços do petróleo aparece hoje como grande fonte de incertezas para o desempenho do setor neste ano. Somente em maio, o petróleo, que representa cerca de 40% dos custos das empresas aéreas, teve alta de 29,7%. Para Kelly, a desvalorização do dólar não será suficiente para compensar essa alta. Dessa forma, pode haver impacto na margem de lucro das empresas.

Mercado de ações
No caso do mercado de ações, quem pode sair arranhada é a Air France, cujos papéis devem apurar desvalorização de 5% a 10%. Mas tudo irá depender, segundo Martins, do plano de contingenciamento de crise da empresa. "Além disso, é preciso apurar se o desaparecimento foi causado por fator controlado [falha técnica] ou natural [raio]. A queda dos papéis costuma ocorrer quando a causa é um fator controlado", afirma o consultor.

Ruy Coutinho do Nascimento, da Latinlink Consultoria Empresarial, compartilha da opinião de Martins e diz ainda que outro fator que pode afetar as ações da Air France é o custo de ações judiciais movidas por parentes de passageiros. Pode minimizar esse impacto o fato de que as grandes companhias aéreas costumam fazer seguros para se proteger desse tipo de processo.

Os analistas também são unânimes em afirmar que não deverá haver impactos para os papéis da Gol e da TAM. "Isso só ocorreria caso fosse comprovado que o episódio foi provocado por falhas no controle aéreo brasileiro. Caso contrário, as ações das empresas brasileiras continuarão estáveis", afirma Mizuaki.

"Quando aconteceram acidentes que envolveram diretamente a TAM e Gol, não houve impacto a longo prazo para os papéis das duas empresas. Dessa forma, não vejo reflexos do acidente em relação ao desempenho das ações agora", diz a analista da SLW.

Ao que tudo indica as ações da Embraer também não deverão sentir os efeitos do desaparecimento da aeronave. "Hoje o comportamento dos papéis da empresa depende de outros fatores como a valorização do real, uma vez que os custos da companhia estão em moeda nacional enquanto a receita segue o dólar, e de possíveis reduções nos planos de expansão de frota de seus clientes ", afirma a analista da SLW.

Essas análises parecem corroborar com a visão dos investidores. As ações da TAM (TAMM4), Gol (GOLL4) e Embraer (EMBR3) encerraram o pregão desta segunda-feira com altas de 3,86%, 2,92% e 0,55%, respectivamente. O Ibovespa fechou com valorização de 2,42% a 54.486 pontos.

Causas
“O que se tem de fato é a informação da Air France que houve uma pane elétrica que gerou uma mensagem da aeronave avisando o problema. A hipótese do raio é remota. Dificilmente vai afetar o sistema elétrico do avião a ponto de derrubá-lo. O mais provável é que tenha sido alguma falha técnica da aeronave", afirma o presidente do Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias (Snea), Ronaldo Jenkins.

Segundo Jenkins, a possibilidade de falha no controle aéreo brasileiro é remota. "O avião saiu da cobertura às 22h48 dos radares de Fernando de Noronha e às 23h20 teria que reportar uma nova posição de tráfego aéreo na região de Cabo Verde. Logo que perceberam a ausência de comunicação, foi realizada uma busca."

Ainda segundo o representante do sindicato das empresas, nesse local há um trecho de uma hora sem cobertura de radar, mas isso é comum em outros trajetos aéreos. No entanto, já está em fase de teste um sistema de vigilância permanente, via satélite, o CSM/ATM (Comunicação, Navegação,Vigilância e Gerenciamento de Tráfego Aéreo) para evitar esse tipo de lacuna na comunicação. A previsão é que a ferramenta entre em operação em 2012.

O Brasil é seguro
No dia 21 de maio, a Anac divulgou nota em seu site que informa que a aviação civil brasileira teve aprovação de 87,3% no índice de conformidade em relação às normas internacionais para o setor. A avaliação foi feita pela Organização de Aviação Civil Internacional (Oaci). A média mundial dos países auditados pela Oaci é de 58,6% - portanto, muito abaixo da brasileira.

Na última auditoria, também realizada pela Oaci em 2000, o país havia atendido às exigências internacionais em 62,6% dos protocolos. A nova auditoria, ainda em versão preliminar, coloca o Brasil em nono lugar entre os 123 países auditados.

As áreas da Anac auditadas foram habilitação, com 95% de conformidade; segurança operacional, com 90%; infraestrutura aeroportuária, com 76%; e aeronavegabilidade, com 89%. Procurada, a Anac, informou que, por enquanto, só irá se manifestar sobre o acidente por meio de notas oficiais.
Por Marcio Orsolini e Gisele Cabrini - Portal Exame
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