quarta-feira, 20 de maio de 2009

O Brasil pode sair mais forte

É o que defendem os prêmios Nobel Edward Prescott, Joseph Stiglitz e Robert Mundell, reunidos no EXAME Fórum. A crise pode custar vários anos de crescimento aos Estados Unidos, mas abre oportunidades a países emergentes - Brasil e China à frente.

EXAME Fórum, em São Paulo: reunião inédita no país de três vencedores do Nobel de Economia

É com um misto de ceticismo em relação aos países ricos e discreto otimismo frente ao mundo emergente que três vencedores do prêmio Nobel de Economia - Edward Prescott, Joseph Stiglitz e Robert Mundell - analisam os recentes sinais de reação na economia mundial. Reunidos em São Paulo no dia 11 de maio para o EXAME Fórum, primeiro encontro no país a juntar três laureados com a mais alta distinção entre economistas, eles foram unânimes em dizer que a queda livre na economia global está próxima do fim, mas que ainda é cedo para declarar vitória. Os efeitos da crise continuarão a ser sentidos por algum tempo. E as soluções, quaisquer que sejam elas, provavelmente levarão tempo para surtir um efeito generalizado no mundo. "Lamentavelmente, os problemas ainda estarão conosco por muitos e muitos meses", disse Stiglitz, professor da Universidade Columbia, ex-economista-chefe do Banco Mundial e um pessimista assumido. Prescott, professor na Universidade do Arizona e conselheiro do Federal Reserve de Minneapolis, uma das divisões do banco central americano, segue uma linha de raciocínio semelhante: "Os Estados Unidos perderão uma década de crescimento, assim como ocorreu com o Japão nos anos 90". Stiglitz, Prescott e Mundell foram os protagonistas do evento A Crise Global e as Alternativas para a Reconstrução da Economia, promovido por EXAME e que contou também com a presença do ex-ministro da Fazenda Delfim Netto. A uma plateia de cerca de 250 empresários, altos executivos e políticos, como o governador de São Paulo, José Serra, eles traçaram um cenário bem mais tranquilo para o Brasil - o país é apontado como um dos mais preparados para sair do atoleiro em que se encontra a economia mundial.

A questão central do debate foi se a atual crise já atingiu seu ápice e quando - e como - se dará o processo de recuperação da economia global. Nesse sentido, há caminhos distintos a ser trilhados. Para os países ricos, em especial os Estados Unidos, o fim da crise depende não apenas de uma recuperação conjuntural, mas sobretudo da regeneração de seu comprometido sistema financeiro. O provável é que o pior da crise terá passado quando os bancos americanos estiverem, enfim, saneados. É um cenário bem distinto do que se vê nos grandes países emergentes, como Brasil e China. "Por aqui, o fim da crise depende somente da volta do crescimento", diz Delfim Netto. Não é para menos que as previsões para os Estados Unidos são desalentadoras. "A tempestade está apenas no começo", disse Stiglitz. As evidências vêm do aumento do desemprego, da queda na renda e da estagnação do consumo - item considerado fundamental para manter aquecido o motor da economia americana. No mercado imobiliário, apesar dos primeiros sinais de aumento na venda de novas residências, a situação continua grave. Calcula-se que, em 2010, cerca de 2 milhões de hipotecas serão executadas (até agora foram 3,6 milhões). Prescott também prevê tempos difíceis pela frente - embora tenha sido enfático ao dizer que a atual turbulência não é uma reedição da crise dos anos 30, cujos reflexos se estenderam por 25 anos. Segundo ele, a principal diferença é que, até meados do ano passado, a economia americana vinha mantendo um crescimento relativamente forte. Desde então, três trimestres fecharam em queda - retração pequena quando comparada à perda ocorrida no crescimento após o crash da bolsa americana, em 1929.

Stiglitz, Prescott e Mundell seguem linhas políticas e acadêmicas diferentes. Mas compartilham da mesma visão em relação aos primeiros 100 dias de Barack Obama à frente da Presidência dos Estados Unidos. Obama teria errado em vários aspectos de seu plano de socorro à economia. "Obama está indo na direção errada em relação aos impostos. Esse é o maior equívoco do programa de recuperação", afirmou Mundell, professor de Columbia e conselheiro do governo chinês. Ele defende uma forte redução de impostos para as companhias americanas - dos atuais 35% para 15%. Segundo Mundell, sem esses cortes, a reação da economia será retardada e não aplacará um dos principais problemas das empresas nos Estados Unidos: a deficiência de lucros.

Assim como o tom sombrio pairou sobre as análises da economia americana, um otimismo moderado marcou a avaliação do mundo emergente. O pacote de recuperação da China - o país é tido como um potencial vencedor ao final da crise - é considerado o mais eficaz entre os lançados até agora. "O Brasil, por sua vez, tem claras vantagens sobre os outros emergentes", disse Delfim Netto. "É o único, nesse grupo, com instituições e democracia consolidadas." Aos 82 anos, e visto como um dos principais interlocutores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na área da economia, Delfim previu um PIB brasileiro em queda até o final do terceiro trimestre deste ano. A partir do quarto trimestre, a economia retomaria o fôlego, podendo crescer até 4% em 2010.

O impacto menor da crise no Brasil foi entendido como herança de boas políticas adotadas - que têm garantido uma margem de manobra ao governo brasileiro. O país conta com 200 bilhões de dólares de reservas, posição mais confortável em comparação a crises do passado. Além disso, ainda há margem para o Brasil reduzir os juros - um tipo de munição em falta nos Estados Unidos, hoje com uma taxa de juro negativa. "A questão não é se o Brasil se tornará um país rico, mas quando isso vai ocorrer", disse Prescott. "Para isso, o país precisa estar integrado às economias mais avançadas, aumentando as exportações de alta tecnologia, internacionalizando suas empresas e atraindo mais multinacionais." Também foram lembrados os entraves no caminho do Brasil em direção ao clube dos ricos. Em horas de crise, antigos problemas - como alta carga tributária e carência em infraestrutura - cobram seu preço. "É preciso estar preparado para a retomada que virá e para aproveitar as oportunidades que já estão à nossa frente. É preciso estar preparado para sairmos desta crise mais fortes do que entramos nela", disse Roberto Civita, editor de EXAME e presidente do conselho de administração do Grupo Abril, na abertura do evento.

Por: Portal Exame

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