Costumo afirmar que o alcance do desenvolvimento sustentável pela via dos negócios deve estar assentado em quatro pilares: gestão, tecnologia, mercado e crédito. Qualquer empreendimento deve ser administrado com profissionalismo, tendo por base um cuidadoso planejamento. A produção de um bem ou de um serviço, ao incorporar processos compatíveis com alta produtividade e qualidade, assegura a competitividade no mercado, arduamente buscada pela empresa. Já o crédito é o motor que dá a partida e mantém em funcionamento qualquer atividade produtiva.
Neste canto de página que venho ocupando semanalmente, testando a paciência de alguns, tenho dado ênfase ao mercado. Não é sem propósito que insisto no tema. De muito pouco valerá produzir com a máxima qualidade e eficácia, inclusive no equacionamento de custos, se o mercado não for demandante e não estiver acessível. A demanda é que manda.
A abertura de mercado para a pequena empresa é vista pelo SEBRAE como um ponto inarredável, um caminho natural que gera resultados econômicos e sociais relevantes. Esse é o caso do movimento Comércio Justo ('Fair Trade), baseado no respeito às pessoas e à natureza.
O Comércio Justo nasceu na Europa, há cerca de 25 anos. Àquela época (não é tão diferente agora!) os países do hemisfério norte, ricos e industrializados, usavam como matéria-prima produtos primários sem agregação de valor, adquiridos a preço vil a países do cone sul, pobres e com indústrias incipientes. O fosso entre ricos e pobres se alargava cada vez mais à medida que os preços dos bens industrializados subiam, contrastando com as freqüentes quebras de safra dos bens primários, até mesmo por questões climáticas. Para pequenos produtores a situação era dramática, chegando a ameaçar sua sobrevivência. As dificuldades vinham da falta de capital que desse suporte às crises, e da dependência a atravessadores. Os menores lucros ficavam para o produtor rural.
A reação às injustiças e ao desequilíbrio social decorrentes do comércio internacional resultou na criação do Comércio Justo. Mas, para que os produtores consigam vender o maior volume possível a um preço justo, é necessário que o consumidor acredite que o preço pago irá beneficiar diretamente àquele produtor. Essa confiança tem por base um selo de certificação, que garante, além dos requisitos de qualidade do produto, a destinação de parte do valor pago pelo comprador a melhorias econômicas, sociais e ambientais da região produtora. São bônus destinados à concessão de crédito a juros mais baixos, melhoria de escolas, centros de saúde, saneamento e tratamento de resíduos.
Hoje o movimento está difundido praticamente em todo o planeta. Em busca de justiça o consumidor consciente aceita pagar mais por um produto que agrega responsabilidade social. Na Europa o Comércio Justo movimenta por ano cerca de U$ 230 bilhões, e as “Lojas do Mundo” concentram cerca de 80% de suas vendas em produtos certificados. Embora no Brasil haja falta de dados estatísticos, é notório o crescente interesse pelo tema.
Começamos a trabalhar em Comércio Justo prospectando compradores internacionais que viessem participar de Rodadas de Negócios, na Expofruit, em Mossoró. O potencial de mercado com demanda insatisfeita para produtos com certificação Fair Trade foi identificado, e, como os princípios norteadores das relações comerciais em Comércio Justo são amplamente defendidos pelo SEBRAE, logo intensificamos nossas ações nessa área. Resultados práticos estão sendo obtidos. O melão produzido na localidade Pau Branco, em Mossoró, já foi analisado e considerado de excelente qualidade, um passo em direção à certificação e à inserção no comércio internacional. São pequenas iniciativas, é verdade. Mas, isentas de assistencialismo ou paternalismo, seu fortalecimento seria uma bela homenagem à antropóloga Ruth Cardoso.
José Ferreira de Melo Neto
Diretor Superintendente do SEBRAE/RN
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